Salvador, a capital baiana, viveu momentos de caos entre os dias 15 e 17 de abril, por conta de mais uma greve da Polícia Militar, a segunda em menos de dois anos e a terceira na história recente do estado. Tal como já havia ocorrido nas paralisações anteriores, a cidade experimentou um pico de criminalidade, com mais de cinquenta homicídios, quase uma centena de roubos de carros e um sem-número de crimes patrimoniais, incluindo diversos saques a estabelecimentos comerciais. O cenário foi desesperador.
O relevante papel da Polícia Militar no sistema de segurança pública nacional é inquestionável, pois é dela a função repressiva imediata à atuação de criminosos - ainda que sob um modelo passível de grandes questionamentos estruturais, principalmente quanto à permanência da militarização da corporação. Portanto, é natural que, sem a polícia, haja uma crescente nos registros de crimes. Contudo, a paralisação das atividades repressivas da polícia tem um impacto social bastante potencializado por uma diretriz de segurança pública que a cada dia se mostra mais equivocada: o desarmamento civil.
Em momentos de crise, como o vivenciado em Salvador, vê-se o quão fragilizada se torna uma sociedade em que o Estado detém o monopólio da força, sem permitir aos seus cidadãos o acesso aos meios necessários para o exercício de sua autodefesa. O pânico que se instaura de imediato na população com a deflagração da greve policial tem por combustível a certeza da impossibilidade de proteção contra as investidas hostis, num cenário em que se esconder acaba sendo a única conduta unânime. Do mesmo modo, a certeza da ausência de reação contribui para que os bandidos atuem com destemor, o que fica bastante claro ao se observar a forma com que, sem a polícia, agem saqueadores e ladrões – muitos daqueles chamados “de ocasião”.
Por outro lado, os locais já rotineiramente guarnecidos com segurança privada armada sofrem, inegavelmente, efeitos muito menores durante a desordem, o que também confirma – como se isso fosse necessário – a eficácia da utilização de armamento para a contenção criminal. Aliás, não fosse isso uma verdade, não seria este o principal instrumento de trabalho de qualquer força de segurança, pública ou privada.
Há mais de uma década o Brasil, empiricamente, elegeu o desarmamento civil como carro-chefe da segurança pública, na esperança de conter a crescente de homicídios que afligia o país. Os resultados foram negativos e, ao invés de redução, a curva da violência homicida manteve-se em alta, com um aumento generalizado em outros tipos de crime, especialmente os motivados por interesse patrimonial – aí incluídos os que resultam no óbito da vítima. E, se a situação já se tornou mais grave em época de normalidade, quando a atuação policial é retirada da equação o que se vê é o colapso, eis que aí se elimina qualquer possibilidade de contenção delitiva.
O modelo está saturado e precisa ser revisto. Se há algo de positivo quando uma greve policial é deflagrada, isto, inegavelmente, é a lição que um choque de realidade promove sobre concepções teóricas amparadas por pura ideologia. Nos sistemas de segurança pública mais eficientes que se conhece, o cidadão responsavelmente armado é visto como um aliado da polícia na missão de frear as ocorrências criminosas, se firmando como segunda e extrema linha de defesa, elemento do qual não se deve abrir mão. Afinal, como se tem visto no Brasil, não é raro a linha de frente se mostrar insuficiente ou mesmo parar de atuar, e, ao contrário da ficção, no mundo real não há um sinal de luz a ser acionado para chamar um super-herói mascarado capaz de restabelecer a paz.
Fabricio Rebelo/jus.com.br
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